Apesar da dificuldade na obtenção de informações sobre a China, sabe-se que o país tem há muitos anos adotado políticas estatais e concedido subsídios industriais que favorecem diversos setores — e o de alumínio é um deles. Como consequência, a concorrência no comércio internacional torna-se injusta e desleal.
Esse tem sido um grande desafio não apenas para o Brasil, mas para outros países que adotam uma política econômica de mercado, como os Estados Unidos — cujo embate com a China foi constante no governo de Donald Trump. Tal cenário também leva desafios imensos para a Organização Mundial de Comércio (OMC), ao ponto de seu ex-diretor-geral, o brasileiro Roberto Azevedo, ter renunciado ao cargo um ano antes do término — a nova mandatária é a economista nigeriana Ngozi Okonjo-Iweala.
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Para debater a complexa questão, a Associação Brasileira do Alumínio (ABAL) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) organizaram uma live, no dia 11 de fevereiro, com a apresentação de estudos nacionais e internacionais.
Elaborado por ambas as entidades, o documento Programas estatais de apoio ao setor de alumínio na China atualiza o parecer de dois anos atrás da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a análise, feita em 2019, encomendada pela ABAL junto à Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Segundo Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil e sócio fundador da consultoria BMJ, o levantamento mostra que houve crescimento vertiginoso da indústria chinesa de alumínio nos últimos 15 anos.
Em 2005, o país asiático representava 24% de todo o metal primário produzido globalmente. Em 2019, saltou para 54%. No mesmo ano, respondeu por 77% da importação de bauxita, muito acima dos Estados Unidos, que ocupou o 2º lugar, com apenas 4%.
Com isso, a China tornou-se o maior produtor de alumínio do mundo, deslocando os principais players a partir de um comportamento considerado não próprio ao mercado.
“Esse fenômeno ocorreu graças à participação direta de empresas estatais e do governo central chinês na cadeia produtiva do metal, além de subsídios que foram distribuídos por toda a cadeia de produção”, explica Barral.
Os principais mecanismos de intervenção no mercado de alumínio na China, conforme apontado por investigações realizadas por outros países, foram:
- Controle comercial de insumos;
- Fornecimento de energia a preços subsidiados;
- Concessão de crédito subsidiado;
- Contribuições financeiras e incentivos fiscais;
- Programas de controle de preços.
Efeitos sobre os mercados
O comportamento da China causou aumento de medidas de defesa comercial no mundo inteiro, tanto de antidumping — (que evitam a prática de exportação de produtos a preço inferior ao praticado no mercado de origem) — em países como Argentina, Colômbia, Coreia do Sul e Turquia, como de salvaguarda (aplicação de barreiras sobre o alumínio de qualquer origem), vistas na Indonésia, Egito e Tailândia.
Além disso, ocorreu o chamado double remedies AD + MC nos Estados Unidos, Austrália e Canadá, por exemplo. Nesses países foram aplicadas não apenas as medidas antidumping, mas também as compensatórias (destinadas a proteger a indústria nacional contra a concessão de subsídios pelo país exportador) sobre o mesmo produto.
De acordo com a análise da FGV, há evidências de que o setor de alumínio no Brasil sofre os efeitos do típico desvio de comércio, absorvendo parte das exportações da China que deixam de ir para esses importadores que aplicam estratégias de proteção comercial.
“Como a grande causa por trás da competitividade chinesa no setor de alumínio são os subsídios, a medida aplicável deveria ser a compensatória. Mas o Brasil tem pouca experiência nessa área e dificuldade de acesso aos dados sobre a economia chinesa. Além disso, o atual governo tem um viés negativo com relação às medidas de defesa comercial”, frisa Barral.
Vale destacar que, em 2020, após denúncia realizada pela ABAL, a Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Economia (Secex) abriu investigação para verificar a prática de dumping na venda de produtos laminados de alumínio chineses. Se confirmada, os produtos do país asiático poderão ser sobretaxados em mais de 50%.