Pegada do bem

Imprimir nos produtos a marca da sustentabilidade, criando indicadores do impacto que eles geram no meio ambiente. Essa é uma tendência nas grandes empresas e a Nespresso é um ícone dessa mudança. Metas de eficiência energética e de redução da pegada de carbono – adotadas por diversos países, especialmente os europeus – foram incorporadas à estratégia das empresas, como da fabricante de máquinas de café, que criou sua receita de sucesso: “Café, alumínio e clima”, conta Guilherme Amado, gerente de café verde da Nespresso.

Combinando a preocupação com as mudanças climáticas a um café exclusivo e a escolha assertiva pelo alumínio, a empresa criou o The Positive Cup, programa de metas lançado em 2014, que se compromete a trazer, em cada cafezinho, um impacto social e ambiental favorável. O programa traduz a filosofia da empresa no que diz respeito à gestão de recursos naturais e como se posicionar no mercado, dialogando com o consumidor.

“Evoluímos a nossa maneira de pensar, agir e produzir considerando a gestão dos aspectos ambientais, sociais e econômicos da nossa cadeia de valores”, explica Amado.

A proposta é ambiciosa e exigiu investimento global de US$ 518 milhões. O alumínio está no centro do plano, que tem como alvo trabalhar com 100% de gestão sustentável do alumínio, oferecer 100% de capacidade de reciclagem para os clientes, por meio da rede própria de coleta e separação, reduzir em mais 10% a pegada de carbono em nível global e neutralizar 100% das emissões de gases poluentes no plantio de 10 milhões de mudas de árvores.

O reposicionamento começou em 2003 e veio amadurecendo. Já em 2009, passou a readequar os processos internos para atender ao programa Ecolaboration, que exigia a aquisição de café de fazendas credenciadas com critérios de sustentabilidade, a conquista de 20% na redução da pegada de carbono e 75% de reciclagem de cápsulas de alumínio – encaminhadas para parceiros especializados na refusão do metal.

Globalmente, foi criada uma grande rede de coleta das cápsulas, com modelos regionais, respeitando cada legislação. São 14 mil pontos de coleta distribuídos por 27 países, localizados nas Boutiques Nespresso, nos centros comunitários de reciclagem de resíduos, em um programa de retirada em domicílio e em varejistas parceiros da marca. No Brasil, as cápsulas são coletadas e enviadas para um centro próprio de triagem, onde são trituradas, peneiradas, separadas e endereçadas a parceiros.

O compromisso cruza as portas da empresa. A Nespresso integra o grupo de 14 multinacionais que dão vida ao Aluminium Stewardship Initiative (ASI). Criada há dois anos, a iniciativa busca desenvolver parâmetros globais unificados de sustentabilidade ambiental, social e corporativa para o alumínio. “Participamos da criação da nova norma para gestão sustentável de alumínio ASI e somente compraremos o material de fontes certificadas nesse padrão”, explica Amado.

Junto da Nespresso, estão Rexam, Tetra Pak, Audi, BMW, Jaguar Land Rover – além de empresas da indústria do alumínio, como Hydro, Novelis e Rio Tinto Alcan. O documento elaborado pela ASI passou por consulta pública e atualmente está em fase de análise.

A ESCOLHA
Em 2013, a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera alcançou seu recorde, podendo ultrapassar o nível de 400 partes por milhão entre 2015 e 2016 – o índice seguro (e que já ficou para trás) é de 350 partes. Os países do G-20, encabeçados por China e EUA, são responsáveis por 45% das emissões globais. Quase 60 países, entre desenvolvidos e em desenvolvimento, estabeleceram metas de redução, mas que são insuficientes. Buscar eficiência energética tornou-se urgente.

Dos anos 1990 até hoje, mesmo com a produção mundial de alumínio primário tendo crescido mais de 150%, os níveis de emissão foram reduzidos de 100 milhões de toneladas de CO2 equivalente para 32 milhões, em 2013, segundo levantamento do International Aluminium Institute (IAI). Os números impulsionam um consumo crescente do metal. Só no mercado europeu, segundo dados da EAA, a demanda passará dos atuais 12 milhões de toneladas para 20 milhões de toneladas anuais, em 2050. Assim, o alumínio tem se mostrado alternativa sustentável para uma ampla gama de produtos acabados. Um dos principais atrativos é o potencial de reciclagem do alumínio, que traz baixo consumo de energia (5% do exigido para a produção do metal primário) e gera um insumo com propriedades técnicas preservadas.

A Nespresso acrescenta outros fatores à conta: “Devido à leveza, o uso do alumínio também proporciona uma economia em termos de transporte e meio ambiente em comparação com outros materiais de embalagem, além de ser um material infinitamente reciclável”, diz Amado. Ele ainda afirma que a característica se soma ao fato de as cápsulas de alumínio serem as únicas capazes de conservar os “grands crus”, em referência aos cafés delicados e de alta qualidade da marca.

ARGUMENTOS
A busca por uma produção ambientalmente responsável tem trazido à tona mais argumentos a favor do alumínio. Em junho último, a European Aluminium Association (EAA) fez um anúncio público em que ressalta como o metal contribui para as metas de eficiência energética e combate ao aquecimento global.

Segundo a EAA, 40% do consumo de energia na União Europeia provêm de edifícios. As construções, portanto, concentram alto potencial para economia energética. “Fachadas inteligentes que incorporam sistemas de alumínio podem reduzir o consumo de energia em até 50%”, exemplifica Gerd Götz, diretor-geral da EAA para a revista Alumínio.

Götz aponta para duas claras tendências que vêm surgindo na Europa: o reconhecimento crescente de que a eficiência energética é a chave para alcançar os objetivos sociais comuns da comunidade europeia; e o crescimento da vontade política dos membros da União Europeia (UE) de equilibrar as metas climáticas com a competitividade imperativa da indústria de um lado.

Sinal disso é o anúncio feito pelo Conselho da UE da meta de redução de 40% das emissões até 2030 – o que não constava nas propostas iniciais, publicadas em janeiro de 2014. Segundo Götz, o movimento incute nas empresas a necessidade de refletir sobre suas escolhas em seus processos produtivos: “Ao desenvolver novas políticas, metas e indicadores de recursos eficientes, devemos aplicar uma abordagem da avaliação do ciclo de vida levando em consideração os impactos de materiais no design, produção, uso e reciclagem de produtos”.

PARCERIA
Outras empresas têm investido em alumínio como resposta aos compromissos ambientais. Exemplos não faltam. A Land Rover reduziu 420 quilos do peso total de sua Range Rover Vogue ao utilizar o metal em todas as partes estruturais do veículo. Já a Ford eliminou 317 quilos ao aplicar ligas de alta resistência na carroceria da picape F-150. Apesar de o setor de transportes ser um dos que apresentam mais soluções, não está sozinho. A cervejaria americana artesanal Red Hare Brewing Company está envasando seu produto exclusivamente em latas fabricadas com a chapa de alumínio chamada de evercan, marca da Novelis, que tem em sua composição o mínimo de 90% de material reciclado.

Roberta Soares, da Novelis, conta que para Roger Davis, fundador e CEO da cervejaria, “a certificação do processo de ciclo fechado da evercan fortalece o compromisso da cervejaria de empregar as melhores práticas de negócio sustentável, tornando a evercan uma extensão natural da marca Red Hare”, conta.

“Quando melhoramos o perfil de sustentabilidade dos nossos produtos, melhoramos também a sustentabilidade dos produtos finais. Ou seja, se reduzimos a nossa pegada de carbono, consequentemente, também reduzimos a do nosso cliente”, reforça Roberta, da marca de laminados, que tem como meta global a utilização de 80% de alumínio reciclado em seus produtos, até 2020.

A mudança para a abordagem de ciclo fechado e baixo carbono é estratégica e envolve
todos os públicos da empresa. “Isto afeta quase todos os aspectos de nosso negócio – do design ao relacionamento com os clientes”.

INICIATIVAS
No Brasil, o potencial do alumínio como parceiro na redução de impacto ambiental ainda é pouco explorado. Especialmente se se tiver em vista que, devido à matriz energética, predominantemente hidrelétrica, os bens produzidos a partir do alumínio primário brasileiro apresentam metade da pegada de carbono da média global: 2,66 toneladas CO2 eq/t Al contra 7,1 toneladas CO2 eq/t Al.

“Não vemos no país o mesmo movimento que se vê nos Estados Unidos e na Europa, com o uso do alumínio em veículos visando a redução de peso. Isso acontece, principalmente, porque lá há o drive da legislação, com metas de eficiência energética a serem cumpridas. O Brasil tem o Inovar-Auto, mas iniciamos o processo de forma tardia”, analisa Roberta, da Novelis.

Ainda assim, as empresas estão se antecipando, atendendo nichos e também educando o mercado. É o caso da Alcoa, que tem inovado em produtos que permitam ao cliente reduzir o impacto ambiental levado à sociedade. O Reynobond EcoClean vai nessa linha.

Trata-se de uma tinta invisível que provoca uma constante reação química. A camada de dióxido de titânio da tinta age como catalisadora da luz do sol quando aplicada sobre uma superfície de alumínio. Quando os elétrons presentes no produto são aquecidos, interagem com as moléculas de ar e, durante esse processo, as substâncias liberadas destroem poluentes e fazem a autolimpeza da superfície em que foi aplicado.

“Ao ser utilizado em um edifício de 1.000 m², por exemplo, o produto pode compensar as emissões de poluentes geradas por quatro carros em um dia, o equivalente à capacidade de limpeza do ar de aproximadamente 80 árvores”, explica Fábio Abdalla, gerente de sustentabilidade da Alcoa.

As novidades integram a estratégia global 2020-2030 da empresa, que também tem integrado a sustentabilidade a todas as operações. “Com base em 2005, a meta da Alcoa é reduzir em 30% o total da intensidade de emissões de dióxido de carbono equivalente (CO2e) em produtos primários até 2020; e em 35%, até 2030”, aponta.

LATAS PARA BEBIDAS
O principal case nacional de sustentabilidade aplicada a produtos são as latinhas de alumínio. Em 2012, foram 19,8 bilhões unidades recicladas, ou seja, 97,9% do volume comercializado no período. “Nossos clientes já têm consciência de que a lata é uma opção mais amiga do meio ambiente”, diz Jose Luiz Tortelli, diretor de suprimentos, logística, TI e sustentabilidade da Rexam América do Sul.

A empresa, recentemente incluída no Índice Dow Jones de Sustentabilidade, assumiu um compromisso ambiental a partir do produto: estabeleceu como meta a redução da pegada de carbono total da lata que produz em 25% até 2020. Tortelli aponta como exemplo
o projeto recente com a Smirnoff Ice, em que foi colocada no mercado a garrafa de alumínio mais leve da América do Sul, com menor consumo de matéria-prima. “Uma embalagem bastante sustentável, em um projeto em parceria com o cliente. A Rexam acredita que cada vez mais o consumidor também vai caminhar para este pensamento”, reforça.

PROCESSOS
Algumas empresas da cadeia do alumínio têm melhorado seus processos fabris como um todo pensando em oferecer produtos com melhor desempenho ambiental. A Alumar apostou na redução das emissões de CO2 através do controle do efeito anódico na produção de alumínio primário, usando modelos matemáticos. “Os principais resultados foram a redução do tempo nas emissões e também a redução de 25% da quantidade de ocorrências”, conta Nilson Ferraz, diretor da Alumar.

A empreitada diminuiu em 78% o volume de gases perfluorcarbonos emitidos em 2013 e rendeu à empresa o selo de sustentabilidade do Programa Benchmarking Brasil 2014, do Instituto Mais. Em 2012, em parceria com a Liquigás, os fornos de cozimento de nodo foram convertidos do óleo diesel para flex gás, um investimento de R$ 30 milhões que reduzirá a emissão em cerca de 12 mil toneladas de dióxido de carbono (CO2) ao ano – 30%.

Já a Hydro está desenvolvendo ações que integram o programa global Maior, Melhor e Mais Verde, “deixando claro para o público externo e interno que temos uma estratégia de sustentabilidade bem definida”, explica Alberto Fabrini, vice-presidente executivo da empresa. Além de ter metas para resíduos sólidos e reflorestamento, também há projetos para a recuperação do solo após a lavra da bauxita e o objetivo de neutralizar o carbono, em 2020.

Na Hydro Alunorte, o plano é que entre em operação em 2016 o uso de um filtro prensa para tratamento do resíduo de bauxita. Com essa solução, além do ganho ambiental com a diminuição de descartes, haverá retorno econômico, uma vez que não será necessária a destinação de grandes volumes a aterros.

Parceria entre a Alcoa, a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e a Escola Politécnica daUniversidade de São Paulo (Poli) permitiu o desenvolvimento de novas aplicações para o resíduo do refino da bauxita na indústria do cimento. “Outro conceito inovador é a alteração do resíduo por meio de interações de longo prazo com os micro-organismos vivos e as intempéries até que ele se torne inócuo para o meio ambiente”, conta Abdalla.

Outras empresas buscaram a melhoria dos insumos usados na fabricação de produtos de alumínio. Especializada em móveis de alumínio para ambientes externos, a Bauxic estava procurando acabamentos coloridos ambientalmente amigáveis. Conheceu a CPA Corantes e passou a usar os novos corantes orgânicos, livres de metais pesados, da marca. “A crescente preocupação com o meio ambiente tem levado os clientes a exigirem produtos cada vez mais ‘limpos'”, diz João Ricardo Baptista, diretor da CPA Corantes, que acrescenta: “Tivemos resultados excelentes comprovando que eles suportam exposição ao tempo por mais de seis anos”, conta Baptista.

Por diferentes iniciativas, o mercado começa a conhecer os investimentos da indústria do alumínio em prol de resultados ambientais sustentáveis. Os avanços têm posicionado o metal como solução para as necessidades da sociedade. Não só de hoje, mas do porvir.

Matéria publicada na edição 41 – 4º Trimestre 2014

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